Resenha de Trilha Sonora: THE LIGHT BETWEEN THE OCEANS – Alexandre Desplat


lbto-cdMúsica composta por Alexandre Desplat
Selo
: Lakeshore Records
Formato
: CD
Lançamento: 02/09/2016
Cotação: star_4_5

Baseado no livro homônimo de M. L. Stedman, o drama A Luz Entre Oceanos (The Light Between Oceans, 2016), atualmente em exibição nos cinemas brasileiros, foi dirigido por Derek Cianfrance e estrelado por Michael Fassbender e Alicia Vikander. A trama se passa na Austrália, após a Primeira Guerra Mundial, e conta a história de Tom (Fassbender), um veterano do conflito, que é contratado para trabalhar num farol. Lá, ele se apaixona e se casa com Isabel (Vikander). O casal tenta a todo custo ter filhos, sem sucesso. Um dia, Tom encontra um barco à deriva, contendo um corpo de um homem morto e um bebê, o qual ele e Isabel decidem adotar como sua filha – uma decisão que, anos depois, trará consequências ao casal.

Uma das estrelas em ascensão do cinema independente norte-americano, o diretor Cianfrance tentou trabalhar com o compositor Alexandre Desplat em seus dois longas anteriores, Namorados para Sempre (Blue Valentine, 2010) e O Lugar Onde Tudo Termina (The Place Beyond the Pines, 2013), sempre sem sucesso. Finalmente, as estrelas se alinharam e Cianfrance finalmente conseguiu contratar Desplat para A Luz Entre Oceanos. Mais do que acostumado a dramas de época, tendo musicado uma grande variedade de filmes do tipo ao longo das duas últimas décadas, o músico francês escreveu uma trilha que se tornou um dos aspectos mais elogiados da produção.

O compositor teve de começar a trabalhar em seu score antes mesmo das filmagens, quando o diretor lhe pediu que escrevesse uma peça para piano que seria tocada no set por Alicia Vikander. O resultado, conforme podemos ouvir na quinta faixa do disco lançado pela Lakeshore, é uma melodia que agradou tanto ao diretor e seu compositor que a dupla resolveu incorporá-lo ao score, como o tema de Isabel. Sua primeira aparição no disco, na verdade, se dá em Letters, no qual é interpretado pela pianista clássica Ieva Jokubaviciute, acompanhada por violinos e leves texturas eletrônicas. Depois, ele faz uma breve aparição no piano na atmosférica e sensível At First Sight, cujas texturas de cordas, similares às orquestrações surrealistas de A Árvore da Vida (The Tree of Life, 2011), dão um tom quase sonhador ao relacionamento entre Tom e Isabel. Infelizmente, ele depois desaparece por boa parte da trilha, retornando apenas ao final das emocionantes Still Your Husband e Each Day We Spent Together, de forma extremamente triste e melancólica, no piano e glockenspiel. Em ambos os cues, o tema aparece desconstruído, com apenas as suas três primeiras notas (bastante similares às que iniciam o tema Dreamcatcher, de seu score para Lua Nova, diga-se de passagem), como se mostrasse que, após tanta tristeza, Isabel fosse apenas uma sombra de si mesma.

A trilha também inclui alguns outros temas e motivos, o mais proeminente deles sendo o de Tom. Ouvido pela primeira vez na faixa que carrega o mesmo nome do personagem, ele é apresentado como uma valsa para toda a orquestra, mais sombria que o tema de sua esposa. Tom é uma figura amarga e traumatizada após suas experiências na guerra, portanto, sua música tende a refletir este estado de espírito. To Resent oferece uma performance mais lenta e melancólica – sua interpretação no piano, acompanhado por baixos sombrios, ao fim do cue, serve como uma ótima representação de sua mente fragilizada. Aliás, tal como o tema de Isabel, o de Tom também ganha uma faixa onde ele é ouvido apenas no piano, em Janus, porém, sua interpretação aqui é amarga e carregada, como se retratasse sutilmente a ameaça que Tom estava se tornando. Mais adiante, em Hannah Roennfeldt, ouvimos uma versão distorcida e torturada do tema, numa faixa carregada de profunda tristeza. Assim, chega a ser quase um alívio quando o tema do personagem retorna de forma romântica em Path of Light, uma faixa repleta da mesma nostalgia com a qual Desplat imbuiu seu score para O Curioso Caso de Benjamin Button (The Curious Case of Benjamin Button, 2008).

Tal como na maioria das trilhas de Desplat (e diferentemente de muitos álbuns lançados hoje em dia), aqui todas as faixas, ao mesmo tempo em que formam um arco narrativo altamente gratificante, também são belas peças musicais. O clima ao longo do score é predominantemente melancólico, mas, ainda assim, podemos encontrar alguns momentos mais luminosos. In God’s Hands, por exemplo, é romântica e tranquila, demonstrando a vida simples e doméstica da família, enquanto Lucy Grace, apresentando um novo tema para a filha do casal, é mais inocente e sonhadora, incluindo um prato e marimbas na orquestração. Por outro lado, The Rattle utiliza baixos, cellos, percussão e sopros para criar ambientações sombrias e dramáticas. Depois, A Wonderful Father é uma das melhores faixas da trilha: construída ao redor de um motivo aparentemente simples, Desplat muda a sua orquestração ao longo do cue, que ganha em intensidade e dramaticidade conforme a faixa prossegue rumo ao clímax. Enfim, uma excelente faixa, que por trás de sua aparente simplicidade, esconde grande complexidade psicológica, os sentimentos conflituosos e ressentimentos ocultos dos personagens. The Return, por sua vez, é tão boa quanto, e consegue ser ainda mais sombria: aqui, Desplat demonstra ser um excelente aprendiz de John Barry, ao utilizar sua orquestra para transmitir sentimentos de tristeza, tal como os scores da última fase da carreira do lendário compositor inglês. Ao fim da faixa, baixos ameaçadores transmitem ameaça e a tragédia iminente que paira sobre a família.

Nas últimas cinco faixas do disco, todas as emoções construídas pela música atingem o clímax de seu conflito. Com quase cinco minutos de duração cada uma, as mencionadas Still Your Husband, Each Day We Spent Together, bem como To Be Loved, retratam o turbilhão emocional vivido pelos personagens, caminhando rumo a uma conclusão e, para isso, trazendo de volta ambos os temas de Tom e Isabel. Entre elas, To Forgive recupera um motivo ouvido inicialmente em In God’s Hands, criando um senso de finalidade e fechamento à música. Por fim, a suíte The Light Between The Oceans encerra o disco com uma expansiva performance do tema de Isabel em toda a orquestra.

Infelizmente, o longa não fez barulho nas bilheterias, nem foi exatamente um sucesso com os críticos, o que certamente poderá prejudicar as oportunidades de seu score concorrer ao Oscar. Ainda assim, não seria uma injustiça se ele fosse indicado na temporada de premiações. Além de ser extremamente bela e tocante, a música do compositor retrata com maestria a complexidade psicológica e as emoções conflituosas dos personagens, sem ser exageradamente melodramático. Inteligente, sem deixar de ser sensível, esta é mais uma ótima trilha de Desplat, que não deve ser perdida.

Faixas:

1. Letters  2:00
2. Tom  3:06
3. At First Sight  3:13
4. The Dinghy  2:20
5. Isabel  1:27
6. In God’s Hands  4:56
7. The Rattle  2:35
8. To Resent  4:35
9. Janus  1:48
10. A Wonderful Father  3:21
11. Lucy Grace  3:33
12. Path of Light  2:36
13. The Return  3:59
14. Hannah Roennfeldt  2:19
15. Still Your Husband  4:57
16. To Forgive  1:39
17. Each Day We Spent Together  4:48
18. To Be Loved  4:58
19. The Light Between Oceans  4:02

Duração: 62:12

Tiago Rangel

3 comentários sobre “Resenha de Trilha Sonora: THE LIGHT BETWEEN THE OCEANS – Alexandre Desplat

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